quinta-feira, 1 de julho de 2010

Sem sentido

"Pretend that you owe me nothing,
and all world is green"
Tom Waits

Não há como ouvir se as tuas palavras são mudas. Tanta coisa. De repente um nó na garganta que nunca se desfez, mas que obriguei a afrouxar, enforcando-me outra vez. Você não me viu, mas espiei cada pedaço teu. As nuances do teu rosto coberto pelos óculos escuros, teu andar firme e decidido. Direto. O pescoço que nunca ousei esquecer porque impossível. Ainda que nunca próximo o suficiente. Mas havia deixado para trás tantas coisas e como quem não quer nada estavam todas ali novamente. Só para me provar que fingi esquecer enquanto acreditava que esquecia. A linha reta da tua mandíbula, do teu queixo. Essas coisas não se pode apagar. Nem com todo esforço do mundo. A verdade é que ficava inventando, seguia inventado formas e cores e gostos e cheiros e sensações, querendo assim te desconstruir, até te transformar em uma imagem difusa.
O silêncio também é um direito e precisei aprender. Quase nunca perco a voz, nem por calar demais, e tenho calado cada vez mais. Só falo as quartas. Brincadeira difícil pretender nada dizer. Como é possível? Nunca nada e ainda assim tudo. As respostas não precisam vir. Não tem história para contar. Foi só um descuido. Um minuto a mais, um minuto a menos, passaria incólume. Se eu fechar os olhos agora refaço todos os teus contornos, todos os teus entornos, todos os teus detalhes. Não tem sentido, quem quer só aquilo que pode ter? Quem se contenta? A voz não me falta nunca, só em dias assim. Porque a gente não sabe explicar saudade. Também não sabe explicar amor ou qualquer coisa semelhante a isso. Tanta coisa junta, tantos coisa misturada, tantas pessoas, que eu não sei dizer o que é realmente isso. É uma coisa gigante, sem coesão, sem coerência. Eu tinha esquecido. Eu tinha esquecido. Como é que fui capaz de lembrar? É angustiante não fazer sentido. Não ser coerente dói. E a vida não é coerente. Silogismo idiota, melhor parar por aqui.

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