quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Amores que a gente enterra

É, querido, a gente erra. Divide a vida, o choro, o canto, o gozo, depois percebe que é uma furada sem fim e não se reconhece mais ali. Não dá para embarcar na onda se você esqueceu o pé de pato, assim você se afoga. E a gente, meu bem, a gente se afogou.  Eu não te reconheço mais, você não é o mesmo, ou foram só as lentes dos óculos que eu troquei? A verdade é que você não sabe ouvir verdades, e gosta mesmo de quem te conta mentirinhas enquanto dá tapinhas em tuas costas.

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Tô saindo fora. Deu para mim.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Âncora

para L.


Quando você era apenas uma pequena perspectiva na barriga da tua mãe eu já te chamava de irmão. Depois, quando você nasceu, crescemos e dividimos uma vida unidos por esse amor fraternal. Foi contigo que eu dividi a melhor parte da minha infância. Jogando futebol na garagem do prédio, fazendo pipa e empinando na praça, indo pro clube jogar bola. A vida se abria em infinitas possibilidades e eu chegava mesmo a acreditar que poderíamos tudo. Éramos pequenos mas em nosso sonhos navegávamos o mundo. 
Em algum momento, no entanto, a tua embarcação se afastou da minha. Da de todos nós. E não poucas vezes tentamos te trazer de volta, mas tal qual no poema da Ana C. o velame nos fugia e era impossível sirgar. Você voltava, voltava sempre, mas era cada vez menos você. Com o tempo, deixou de ser o menino chorão com quem passei a minha infância. E embora olhos ainda fossem de menino, teu corpo era de homem grande. Foi como homem formado que você saiu pelo mundo, indo cada vez mais pra longe da gente. Como homem de barba é que se perdeu nos caminhos e não conseguiu voltar. 
Um dia, quis você, assim como Ulisses, ir além dos mares que podia desbravar e se perdeu de nós. Agora tecemos a manta que há de te enrolar quando chegar o momento do teu regresso. Por toda essa tormenta só você pode passar. Domar o teu barco. Amansar o teu mar. Mas eu te lembro, meu caro, que aqui na beira da praia, além-mar, também vivemos a fúria das águas, sofremos a ressaca que destrói de modo impiedoso todos os desenhos, as castelos e as ilusões que construímos na areia. Para você e para nós. É hora de recomeçar. Fincamos bandeira no chão e se quiser, quando voltar, podemos nos tornar o Porto que acolherá o Homem. Sem âncoras. Sem amarras. O Porto no qual você poderá desfrutar da liberdade, sem, no entanto, se perder no mar, se ausentar de nós.