sábado, 5 de junho de 2010

Ladainha: por onde anda José?

José não sabe a hora de parar. Ninguém conhece os seus limites, nem ele, e por isso é que se testa tanto, quer ver o quanto pode suportar. Álcool demais nunca é álcool bastante. Tem gente que bebe para esquecer, José não, ele bebe toda noite é para lembrar. Seja o amor que perdeu ou as crianças que esqueceu pelo caminho. De vez em quando pede perdão por não saber ter ido adiante, mas ele é livre demais para ser de alguém. José é do mundo. Do mundo dele, claro.
Todos os dias, como já disse, José bebe porque precisa se encontrar e lembrar de toda a vida que não pôde viver. Sim, ele bebe para se culpar. Assim como alguns cristão se mortificam, José faz descer pro fundo da garganta toda água ardente que encontra para expiar a própria culpa. As ambições que jamais teve ou que perdeu pelo caminho, é por isso que bebe, precisa recordar. Às vezes chego a ter dó de você, José, que vive rodeado de gente, de mulheres, de amigos, mas que dorme sozinho toda noite no quarto de sua infãncia na casa dos pais. E que de tão sozinho desaprendeu até a chorar. Portanto bebe para tornar a lembrar. E chora. Chora feito criança pequena, de soluçar. Se tenho tanta pena de você assim, é porque ao te ver miúdo, chorando sozinho eu lembro mesmo de mim.
José não sabe construir histórias, vai deixando-as incompletas por onde passa. Não sabe terminá-las ou dar-lhes um rumo. Apenas começa e a vida se encarrega de dar cabo daquilo que ele não soube continuar. Falar de José é falar de corda em casa de enforcado. Quantas mães ficaram a chorar por aí depois das filhas terem conhecido tão ilustre figura? Ah, ele se acaba porque sabe que veio a essa vida a passeio. Sabe que é veneno na boca do outro, portanto condenou-se a andar sozinho, e a idéia não funcionou. Tudo que toca, José destrói, transforma sempre uma parte em ponto escuro. José nasceu para ser só dele mesmo. E se não houvesse eu conhecido sua mãe diria até que ele é uma figura mítica, nascido da própria sombra ou luz. Ou do poema de Carlos Drummond. Quem vai saber? O poeta, talvez, estivesse mesmo pensando em José quando fez todas aquelas perguntas em seu célebre poema, porque o José de quem falo agora também não sabe para onde marcha. E nem toda bebida do mundo foi suficiente para que ele recordasse o caminho.

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