quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Da ausência

"Creio sem crer, como um condenado."
Fazes-me falta - Inês Pedrosa


Para A. que nunca estará longe o bastante e jamais deixará de faltar.

Quase esqueço o teu rosto e procuro presto uma fotografia para me recordar. Fato. Pouco me lembro do teu sorriso e de como seus cabelos ralos se armavam devido ao laquê que insistia em usar. Assusto-me ao pensar que já são quase dois anos. Dois. Duas merdas de anos em que não ouço nem um tracinho da sua voz cantando nossa canção. Ainda dói como se fosse hoje. Ninguém comenta. A dor é coletiva. E não se expurga. O difícil não é viver, é continuar. Continuar todos os dias sabendo que sem você inexiste a mínima perspectiva de melhora. Depois do pico sobra-nos apenas o inevitável vale. Queda bruta e desenfreada.
Esqueço o teu rosto, o teu cheiro, o teu toque e tenho ganas de me mortificar por isso. Tantas coisas piores, tão melhores para se esquecer e por que, então, despedaço-te dentro de mim? Eu que desejei te guardar inteira cá dentro. Eu que jamais deixaria a tua morte te levar de mim, agora procuro fotografias para te lembrar. Quantas vezes é possível uma pessoa morrer? Em mim você morre todos os dias porque é sempre a mesma dor. Ainda que eu sorria, compre livros e beba cerveja em dias de calor. Há em mim uma parte que se mata toda vez que se lembra da tua ausência. Infelizmente não é suficientemente forte para que seja uma parte pelo todo. Por isso resto. Entre silêncios, falta de ar e fotografias. Choros secos, vida seca, vazia.
Sinto falta do teu colo, do esmalte perolado, do abraço e do silêncio que jamais existia. Sinto falta de você. E do que pude ser.

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